Sabemos que…
Tempos de crise sobrecarregam as mulheres
Mulheres são as primeiras a serem demitidas em uma crise
A divisão do trabalho doméstico ainda é pra lá de desequilibrada
Tá, eu sei que ninguém aguenta mais ouvir a palavra pandemia, mas a revista científica The Lancet publicou recentemente um estudo que demonstra como as mulheres foram as mais afetadas pela crise sanitária em diversos campos, como trabalho não-remunerado, educação, emprego e violência.
Notar que em uma crise, qualquer crise, as mulheres são sempre as mais impactadas reforça a ideia de que ter um olhar de gênero como forma de combater o sexismo estrutural se faz necessário e urgente.
A conquista de direitos deveria ser algo linear, que segue em apenas uma direção. Não deveríamos correr risco de perdê-los após termos conquistado.
Mas não é assim.
Em tempos em que as pessoas ainda fazem uma leitura de que o feminismo quer colocar homens e mulheres em posições antagônicas, quando na verdade se busca a equidade para chegarmos à igualdade, parece que nada é garantido.
Direitos das mulheres são direitos humanos essenciais para se chegar à justiça social.
Mas os problemas que há muito já deveriam ter sido superados voltam para nos assombrar. Talvez você esteja acompanhando o podcast “A mulher da casa abandonada” que revela o quão recente é a prática de um dos crimes mais absurdos, o de submeter um outro ser humano em condições análogas à escravidão. E o pior, que é possível sair impune.
Mais preocupante são os dados do Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, que apontam que mais de 58 mil pessoas foram resgatadas de trabalhos análogos à escravidão de 1995 a 2022.
A professora e historiadora Flávia Biroli fala da importância de “desnaturalizar” a desigualdade e violência, e de como isso gerou uma inacreditável reação na direção contrária. “A agenda da igualdade de gênero foi parte da construção e aprofundamento das democracias em diferentes níveis, na segunda metade do século XX. O sistema internacional de direitos humanos se ampliou e se modificou com as pressões dos movimentos de mulheres e feministas, de modo a dar visibilidade (desnaturalizar) e produzir compromissos para a superação da violência e da desigualdade de gênero. As reações, que se iniciaram nos anos 1990 e se tornariam mais coordenadas a partir da segunda década do século XXI, procuram retroceder as conquistas e, principalmente, colocar em xeque a legitimidade política conquistada para essas agendas e políticas de gênero. Trata-se, como definiu Juan Vaggione, de uma ‘politização reativa’. Ela vai no sentido da retradicionalização dos papéis, da renaturalização das desigualdades e da violência”.
Não podemos aceitar a perda de direitos e da liberdade.
Aceitar que as atividades de cuidado e domésticas sejam associadas apenas à mulher.
Reduzir nosso papel ao da maternidade, quando isso é uma escolha.
Que um feminicídio aconteça a cada 7 horas.

E daqui para frente, todas as questões precisam de um olhar de gênero, pois como disse Sima Bahous, diretora executiva da ONU Mulheres, “as crises interligadas que enfrentamos hoje continuam a agravar os impactos umas das outras como multiplicadores de ameaças. Mas as mulheres são as multiplicadoras de soluções”.
Os problemas existem, ou melhor, persistem, e não podemos abdicar da nossa participação e voz ativa em sua resolução, afinal, somos as mais interessadas.
Construir um mundo mais sustentável, mais justo e mais seguro para todas as próximas gerações é algo que precisamos fazer hoje.
E por isso é tão importante não abrir mão de nenhum direito ou da nossa liberdade.

Em frente e para melhor. Esse é o único caminho!